quarta-feira, 8 de março de 2023

Não é fácil viver sozinho

 

A solidão forja mais que mil martelos

 

Sempre que estive a viver sozinho, estava em trabalho ou a batalhar as dores de um coração partido - pelo divórcio e pela viuvez -, ou, por cobardia e medo, empenhado em pôr cobro a essa mesma solidão.

Quem diz que é fácil, mente.

Emparelhar faz parte do projecto da maioria das pessoas que conheço; não me lembro de alguma vez ter ouvido alguém, do meu grupo de amigos, dizer: Eu, quando for grande, vou estar sozinho, inteiro, entregue aos meus cuidados.

Todos nascemos com um cesto e uma seta e andamos a disparar que nem doidos por relações afins. Com sorte uns “matam” e ficam, permanecem, resgatam, encostam-se à carcaça do defunto, ou encontram, na seta espetada, a carne mais tenra do seu amor. Conheço muito pouca gente que não comente em fim de linha, puxa, porque é que a Anabela está sozinha? Porque é que o Francisco não arranja ninguém? Parecem ter vidas felizes, consta que se bastam, mas os casais desconfiam e os solteiros, sem vocação, não compram.

A solidão é uma porcaria. A solidão que fique para quem gosta muito de gatos, é imagem de velhice proscrita, de pessoa que perdeu a senha. Ficar-se só pelo miar, pelo roçar casuístico e o abanar da cauda feliz, não é para mim. Eu ainda quero abanar tudo, a cama, o sofá, as ideias e os tapetes.

A solidão forja mais que mil martelos. É cristal polido, diamante laminado. Se até aqui achavas que estavas só, agora é só mesmo contigo. A solidão opera a um nível tão celular, que a singularidade que gera deixa-te sem lugar. Eu, se fosse a ti, arranjava alguém. Mas depressa, porque se o processo se inicia, há vícios de amor-próprio difíceis de se negar.

Ama antes alguém, acima de a ti mesmo.

E agora, com a vossa licença, vou procurar a minha esposa, a melhor amiga, a melhor amante e a minha sempre, namorada.