Compreendemos apenas o que podemos e
o que somos capazes.
O que podemos compreender é sempre
limitado, misturando em partes incertas exemplos e modelos, valores,
aprendizagens, traços de personalidade e temperamento.
Compreendemos algumas coisas e não
compreendemos outras. Emperramos com detalhes e tropeçamos em enormes questões
que nos baralham e confundem, devolvendo-nos um sentimento de desolação e a
consciência da nossa infinita pequenez e da nossa espantosa condição de seres irracionais
que tendem, permanente e incansavelmente, para a racionalização.
Mas sendo as coisas o que são,
esforçamo-nos por compreender.
Compreender quem somos, de onde vimos
e para onde vamos. Compreender a organização do Universo e as manias dos
organismos unicelulares. Compreender as pessoas, a vida em sociedade, o que
acontece e não acontece.
Compreender vai-se tornando um
exercício compulsivo. Um exercício de monta/desmonta que nos dá controlo,
aproximação ao intangível e a convicção de que no fim há sempre uma resposta à
nossa espera e que chegar lá exorciza o que em nós há de frágil, absurdo e
perecível.
Na nossa busca sagrada de
entendimento, substituímos o enlevo pela compreensão, a empatia pela
curiosidade, a entrega pela observação sistemática. Como se vivêssemos de
entendimento tanto como o pão.
Parece, aliás, que para aceitarmos
qualquer facto como bom temos de compreender, temos de ter aquele momento
fabuloso e curtíssimo em que a impressão vira insight e ele de repente algures
dentro de nós, uma luz se acenda para iluminar uma percepção feita sentido.
Na nossa obsessão de perceber,
construímos realidades virtuais, relações eternas e arrumações do que somos e
sentimos tão tosca quanto consoladoras.
Pode ser que a compreensão seja
apenas mais uma entre todas as outras ilusões, pode ser que não mude nem
acrescente nada, não contribua sequer para mais um grão de felicidade ou
bem-estar. Ainda assim, tentamo-la persistentemente, remetidos que estamos a
esta condição de indómitos buscadores de sentidos, desprezando o facto de
compreendermos apenas o que podemos e o que somos capazes.