terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Haja compreensão...

Compreendemos apenas o que podemos e o que somos capazes.
O que podemos compreender é sempre limitado, misturando em partes incertas exemplos e modelos, valores, aprendizagens, traços de personalidade e temperamento.
Compreendemos algumas coisas e não compreendemos outras. Emperramos com detalhes e tropeçamos em enormes questões que nos baralham e confundem, devolvendo-nos um sentimento de desolação e a consciência da nossa infinita pequenez e da nossa espantosa condição de seres irracionais que tendem, permanente e incansavelmente, para a racionalização.
Mas sendo as coisas o que são, esforçamo-nos por compreender.
Compreender quem somos, de onde vimos e para onde vamos. Compreender a organização do Universo e as manias dos organismos unicelulares. Compreender as pessoas, a vida em sociedade, o que acontece e não acontece.
Compreender vai-se tornando um exercício compulsivo. Um exercício de monta/desmonta que nos dá controlo, aproximação ao intangível e a convicção de que no fim há sempre uma resposta à nossa espera e que chegar lá exorciza o que em nós há de frágil, absurdo e perecível.
Na nossa busca sagrada de entendimento, substituímos o enlevo pela compreensão, a empatia pela curiosidade, a entrega pela observação sistemática. Como se vivêssemos de entendimento tanto como o pão.
Parece, aliás, que para aceitarmos qualquer facto como bom temos de compreender, temos de ter aquele momento fabuloso e curtíssimo em que a impressão vira insight e ele de repente algures dentro de nós, uma luz se acenda para iluminar uma percepção feita sentido.
Na nossa obsessão de perceber, construímos realidades virtuais, relações eternas e arrumações do que somos e sentimos tão tosca quanto consoladoras.

Pode ser que a compreensão seja apenas mais uma entre todas as outras ilusões, pode ser que não mude nem acrescente nada, não contribua sequer para mais um grão de felicidade ou bem-estar. Ainda assim, tentamo-la persistentemente, remetidos que estamos a esta condição de indómitos buscadores de sentidos, desprezando o facto de compreendermos apenas o que podemos e o que somos capazes.

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