Popularmente afirma-se que “a
culpa morre sempre solteira”, querendo com isso dizer que, voltas dadas, contas
feitas, não se consegue descobrir o par à altura. Não se é capaz de descobrir o
tal culpado, a criatura que começou a intriga ou o crime, o responsável último
da acção nefasta.
Se nem que seja o partir de um copo tenha de ter um
culpado, o facto é que se arranjam fórmulas mágicas de aliviar
responsabilidades e explicar, com indiscutível mérito e razoável imaginação,
que foi por causa de um outro, que o copo não devia estar ali, que alguém o pôs
ali de propósito para ser partido e arranjar uma situação desagradável.
Ficamos, pois, com um copo partido e um extraordinário
complô, que, não explicando coisa alguma, dilui responsabilidades e anula
culpas.
Se com copos isto é assim, imaginem com o resto.
A questão, porque de facto o ser assim levanta, pelo
menos, uma importante pergunta, é a de saber por que é que parece tão difícil
assumir que cometemos erros, nos enganamos, avaliamos mal a situação,
desempenhámos ineficazmente a tarefa de que estávamos incumbidos, fomos
arrogante, desprezámos indicadores vitais, não tínhamos razão, desmotivámo-nos,
desinteressámo-nos, facilitámos, confiámos em quem não devíamos, não tivemos atenção,
enfim, o que se queira, sempre no território das desculpas que, ainda assim,
não depreciem o mea culpa
fundamental. Percebe-se que os actos criminosos ou delinquentes se arredem
desta lógica.
Não se percebe por que é que assuntos comezinhos e
quotidianos tenham de ser enrodilhados em histórias compridas e mal contadas,
em que os factos se distorçam e o que apareça como produto final seja uma
nebulosa de mal-entendidos, zangas pessoais, acusações mútuas, afirmações
desgarradas de princípios, que normalmente não vêm nada a propósito.
Dir-se-ia que se confunde a assunção da culpa com o
castigo. Que parece que se acredita que basta dizer-se que se errou para
merecer a sanção colectiva do desamor, do desrespeito ou do desprezo, e que,
por essa via, acreditando que a sorte de um homem é escapar, vale tudo para
instalar a dúvida e fugir à punição. Ou então, e igualmente grave, que
obliteramos o senso de responsabilidade e não o desenvolvemos o suficiente para
viver pacatamente em sociedade.
Chegados aqui, parece que temos de concluir uma de duas
coisas: ou, de facto, somos todos educados, e educamos com tantos “panos
quentes” que assumir o que quer que seja de motu
proprio é um exercício demasiado sofisticado; ou tememos mais a crítica
social do que estimamos a velha e boa ideia de termos a consciência tranquila.
Em qualquer dos casos, venha o Diabo e escolha.
Joaquim Maneta Alhinho
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