Porque somos diferentes encaramos a vida da forma como somos capazes.
Num extremo estarão as pessoas que vivem simplesmente, sem interrogações nem curiosidades metafísicas, nunca experimentando aquelas angústias do "quem sou, donde venho e para onde vou?", que alguns consideram adolescentes, mas que, disfarçadas e polidas, atravessam a vida da maioria dos humanos proporcionando, como ganho secundário, inquietações mobilizadoras e espessuras atraentes.
O que poderia ser a imensa virtude da aceitação incondicional e leve da nossa natureza é, muito mais frequentemente, a limitação da capacidade de pensar.
Do outro lado, na outra ponta do mesmo fio imaginário, encontram-se os que, aterrados pela iminência de um fim, fazem do presente um sobressalto e de muitos anos de interrogações sofridas uma antecâmara tumular. Para esses, o que poderia ser uma qualidade de consciência e lucidez transforma-se frequentemente num tenebroso suplício.
Pelo meio ficam muitas qualidades, espécies e combinações de pessoas nas suas singulares formas de ser e sentir, tudo, incluindo a própria vida.
Algures por aí,nesse meio sem ponto médio, sobressaem uns tantos que fazem da existência um combate, uma luta incessante e estafante. Como que por artes mágicas conseguem sempre arranjar um inimigo. Um arqui-inimigo com recursos extraordinários e mente tortuosa; um inimigo malévolo que espreita a cada esquina, persegue nas sombras e arquitecta planos de vigança, prejuízo ou o que for; ou, à falta de melhor, um adversário poderoso com os mesmos objectivos e enormes ganas de alcançar primeiro uma meta arvorada em grande sentido. Para estes incansáveis guerreiros tudo o que acontece e acontecerá tem como nó górdio a conquista de uns centímetros, a vitória de mais uma disputa, o ganhar de mais um improvável torneio que inventaram e esgrimiram, mesmo que à revelia dos outros participantes.
Fazer da vida um campo de batalha não parece, assim à primeira, um projecto existencial de grande qualidade. Nem parece uma possibilidade realista para os muitos que apreciam amenidades, prazeres suaves, a traquilidade de um fim de tarde ou a alegria de uma gargalhada entre amigos.
Mas que é um poderoso motor do mundo, uma estratégia de contornar a finitude, uma fórmula consagrada de significar todos os dias como se fossem únicos e um entretém mobilizador de todas as energias, é indesmentível.
Só é chato que para que alguns prossigam as suas guerras, tantos pacatos inocentes sejam apanhados e sacrificados numa contenda que não tem fim.
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