Habituados a pensar que as crises alimentares - e, de caminho, políticas -, do terceiro mundo estão de alguma forma relacionadas com a superabundância destes produtos no chamado primeiro mundo, percebemos as afirmações de alguns dirigentes mundiais que, em plena crise, vêm dizer preto no branco que ela deve ser vista, sobretudo para África, como uma oportunidade de resolução da fome e da pobreza, que têm parecido congénitas.
Se estas podem ser as boas notícias, e se o nosso irracional optimismo nos permite olhar para a questão de uma iminente crise alimentar noutros pontos do globo que até agora não a têm sofrido como resolúvel no curto ou no médio prazo, não dá para contornar o grande mistério de tentar perceber como chegámos aqui. Como é que uma coisa destas pode estar a acontecer? Como é que numa sociedade de abundância conseguimos o novo-riquismo absurdo de deixar que o essencial falhe para que o acessório ou mesmo o supérfluo se mantenham? Como é que nos conseguimos entreter tanto, e fascinar tanto, com os dispositivos e os mecanismos que inventámos para expandir a nossa condição humana que nos esquecemos que, por debaixo dela, está, e estará sempre, uma imperial natureza humana?
De repente, a comidinha, que nos países do círculo de que, mal ou bem, fazemos parte, tem sido um adquirido indiscutível, reentrou na ordem do dia com preocupação.
É que também os países ricos têm pobres, muito pobres, e o aumento galopante de alguns preços faz prever que a fome poderá ser um fenómeno com que teremos de nos confrontar quotidianamente em vez de, como até agora, se manter circunscrito a bolsas populacionais restritas ou como tema longinquo de povos de que apenas ouvimos falar.
O facto de esta e outras situações de igual gravidade estarem a acontecer tem mesmo que nos obrigar a reflectir.
Mas que raio é que andamos a fazer?
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